9.9.08

foi quando, de súbito, acordei. ou foi o exato instante em que tomei consciência de mim. sei que eu era de um cansaço extremo. os meus sentidos fervilhavam. o olho não abrira, ainda. e tudo era vermêlho. prêto no vermêlho. o ar entrava sêco, violento. rasgava-me a narina, a garganta. afogava o pulmão. sofri. a boca era viscosa, e sêca. uma sêde tamanha, desesperadora. ousei abrir a bôca, correr a língua pelos lábios. eram de uma dureza de terra, inóspitos, incautos.
tentei me mover. a dureza do chão era muita. e o calor. minha pele era brasa, ardia. o sol me fazia sensível, a tudo. o calôr da pele eu tentava por tudo amainar. mas pele sobre pele, era o fôgo, só.

a solução da vida, era água. o mistério líquido.

espiei. uma fenda na pálpebra. numa fresta, o céu de um azul atormentador invadiu-me inteira, eu engoli pelos olhos o sol e o mundo tôdo. fechei depressa os olhos: foi lento demais. fecundada pelo céu, estava grávida do mundo.
pisquei muito, e longamente.
quando o olho abriu, era uma guerra de dois lados, um valsado de dois antigos desconhecidos. era gritar de um profundo azul, sem nuvens. e o caminhar resignado de um marrom poeirento.
e como se fosse perder os sentidos, a sêde, o calor, o ardor, passou tudo. nada incomodava. eu tinha uma fome profunda do horizonte. e horizonte não havia. enquanto correr eu pude, eu corri. o chão comia meus pés, me queimava. desesperei-me. quis ver, e não podia. era de pó e incerteza meu futuro.
quis chorar, mas eu nada tinha pra verter. eu olhei ao redor de mim, o sol iluminava tudo. secava tudo. o sol escorria de beleza, e feio era, triste.
o susto era tanto que o grito entalou e nunca que escapava. eu olhava bem pro meio de mim. eu via o mistério tôdo. o mistério de mim, o mistério do mundo. todo o mistério se desdobrava na minha frente. sem uma sombra, eu vi o horror da minha existência. eu queimava meus monstros e os gritos eram de horror, deles, e saíam da minha minha boca.
rasgou-se no meu rosto um riso, nefasto. expurguei meus pecados, e eu, mãe do mundo, perdoei tudo. o mundo, no meu ventre, existia porque existia eu.

eu, mundo. eu, deus: verteu água da palma da minha mão.

7 comentários:

Bruno disse...

você fede.
tinhamo.

Anônimo disse...

è sempre impressionante como vc consegue assustar e encantar com apenas algumas palavras!!!!
te adoro

*** Cris *** disse...

Tudo aqui é intenso e eu gosto disso!
Bom fim de semana!
Vou nessa...

Jaya Magalhães disse...

Lua,

Nem me pergunte porquê, mas depois que li teu texto, fiquei com a harmonia do Coldplay na cabeça. Viva la Vida. Talvez por ter assistido o clipe ainda a pouco. Talvez por uma conexão qualquer que a mente resolveu criar. Ou isso:

"I used to rule the world
Seas would rise when I gave the word
Now in the morning I sleep alone
Sweep the streets I used to own..."

O que cabe dizer mesmo é que fiquei daqui, embasbacada, com tua capacidade de expressão. Você expulsa de si tanta coisa misturada, que eu tento abrir os braços de um jeito infinito só pra poder te alcançar. A poesia que você colore é de uma sensibilidade tão estridente, que gruda na gente de um jeito agonizante e belo. Assim mesmo, ao mesmo tempo.

“Fecundada pelo céu, estava grávida do mundo.” - O que é isso em termo de coisa linda? É daquelas coisas que a gente lê e pensa: putz, como eu queria ter escrito isso!

No mais, você precisa saber o quanto sinto minha alma lavada quando passo aqui. Sei que é exposição tua - e só tua. Mas, ainda que atrevidamente, eu pego tuas emoções, e me divido. Na falta palavras saídas de mim, vou assinando junto contigo.

Segredo meu: apenas você, sendo Lua, para carregar o mundo, em si. Ninguém mais para falar com tamanha maestria do sol, da água, nuvens, ar, terra. Ninguém mais. Água se fazendo mistério líquido. Você, no céu da gente. Lua cheia. Grávida. Em versos.

Bom demais te ler, outra vez.
Bom demais.

Meu beijo.

Isadora Alves disse...

enfim, eu aceito um café com cigarros.preciso.

flor disse...

E você, a outra Flor de Azeviche é que escreve lindamente =)
Adorando e ficando =)
Beijos e vou voltar

Karina Mendes disse...

hey moça!
vc é dona de veias onde correm a poesia da melhor qualidade...
parabéns, e obrigada pela sua visita, eu adorei!
;)

volto em breve para ler mais, especialmente o lance do isqueiro que entendo tão bem...rs